Caio Fernando Abreu foi uma das mais importantes figuras da literatura brasileira contemporânea. Basta avaliar a quantidade de livros, estudos, peças e debates criados a partir da obra que nos deixou. Jornalista polêmico, intenso, sarcástico e genial em seus escritos, foi grande amigo de Paula Dip, com quem conviveu durante 20 anos e a quem dedicou um conto no seu clássico Morangos mofados. Aqui, Paula reúne cartas, bilhetes e particularidades que dividiu com o escritor, além de depoimentos de pessoas importantes na vida de Caio, como Cazuza, Ney Matogrosso, entre outros. O resultado é um emocionante relato de quem acompanhou de perto o mundo do “Escritor da Paixão” (como o definiu Lygia Fagundes Telles) até sua morte precoce, aos 47 anos, vítima de aids.
A obra de Caio Fernando Abreu é muito apreciada por jovens universitários. Como jornalista, trabalhou em alguns dos principais jornais e revistas do Brasil, como Veja, Manchete, Zero Hora, Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo.Era o seu método preferido de chegar à redação final daquilo que escrevia: ler em voz alta.
Queria a sonoridade perfeita, o fluxo acertado, a elipse reveladora, o adjetivo sem adornos que valorizasse a narrativa.
Talvez por isso sua palavra seja tão adaptável ao palco do teatro, mesmo quando não escrita especificamente para tal fim.
Cru, cruel, generoso, excessivo, desafiava a neutralidade que regra boa parte do que se escreve no Brasil.
Queria a página viva, a letra pulsante, o verbo sagrado, a forma adequada para valorizar aquilo que lhe era a mais humano de todas as nossas características: a busca, o caminho, a procura de.
Caio era aluno e professor, sujeito e objeto, consciente e intuitivo, sofisticado e popular, engraçado e depressivo. Em seus inúmeros livros publicados, desde o início, acreditou na comunicação direta e imediata com o leitor. Não por acaso, tantos anos depois de sua morte, sua obra tem sido ainda mais valorizada do que antes. É impressionante a identificação das gerações posteriores a ele, e que, sem conhecê-lo vivo, trata de manter viva sua obra.
Caio escreveu compulsivamente, viveu compulsivamente e morreu desejando continuar a escrever.
A literatura, para ele, era matéria viva em direção ao conhecimento do mais obscuro sentimento, a revelar a impossível possibilidade de roçar a eternidade.
Guardava seus rascunhos, seus cadernos, suas frases seminais: tudo era passível de virar obra viva, a partir de sua satisfação com o resultado buscado.
Poucos escritores brasileiros têm, em seu currículo, essa admiração entre seus leitores.
Poucos certamente escapam de uma forma esvaziada de pulsação vital.
Sua excruciante sinceridade é o que explica essa identificação, inclusive com gerações posteriores.
Fruto de seu tempo, sim, mas com o prazo de validade extremamente esgarçado e sem data de vencimento, a literatura de Caio Fernando Abreu revela o homem que ele foi, o cidadão atento ao seu mundo, imerso nas convulsões comportamentais que sacudiram o mundo em suas décadas de adolescente.
Obcecado pela qualidade estética, nunca deixou que sua palavra ficasse estéril.
Não tenho dúvida de que, nesses tempos politicamente corretos e cheios de medo e dúvida, a ousadia de sua palavra será farol a iluminar os breus daqueles que acreditam e buscam forças e fé no intento de viver mais plenamente a vida que lhe cabe.
Caio, o adolescente ousado, o adulto afiado e sem barreiras, foi o melhor exemplo para o Caio escritor, um desses seres especiais e únicos que marcam, a ferro,fogo e felicidade aqueles que tiveram a felicidade de conhecê-lo ou de carregá-lo nas pastas e mochilas. Cada livro de Caio é uma porta de entrada à epifanias verdadeiras. Se você não o leu na íntegra, não perca a oportunidade de.
Luciano Alabarse*